SEM APRENDIZES NÃO HÁ MESTRES
Vivo num
bairro onde há casita bem cuidada, que pertence a homem que em anos de
juventude fora carpinteiro. Artista de valor, reconhecido pela perfeição e
trabalho esmerado.
Em tempos
não afastados, o bom homem chegou a trabalhar para mim; depois, a idade e a
doença, obrigaram-no a recolher-se a casa.
Anteontem,
pela fresca da manhã, sai. Necessitava de cuidar de investimento, que para meu
mal, pouco rende, já que financeiros e Estado encarregaram-se de o delapidar.
Por vezes
cogito: se não me seria melhor ter gasto o dinheiro em viagens, divertimentos e
outros prazeres, do que economizar; mas o mal está feito.
Como ia
dizendo: sai. Mal havia dado curtas passadas, deparei com o carpinteiro, que fazia
seu passeio matinal.
Saudei-o; ia
afastar-me, quando este, carecido de convívio, mete-se à conversa:
- Isto está
mau! Muito feio! Não há emprego, mas não falta trabalho! …Se pudesse ganhava
boa fortuna na biscatagem!
Como não
respondesse, prosseguiu: - Batem-me à porta e pedem-me, pelas almas, que vá
consertar o armário ou janela, que empenaram; mas que quer? A minha coluna não
permite….
Como lhe
dissesse que hoje todos estudam, acrescentou:
- Pois é. No
meu tempo não faltavam artistas por aqui, agora não se encontra um! Já não há
aprendizes! Quer ver, vizinho: conheço camarada que tem um rapaz, que é negação
para os estudos. Então pensou pô-lo a aprender arte. Sabe o que lhe disse o
filho?!
Sussurrei um
“hem” interrogativo, e o homem continuou:
- Que não
quer trabalhar em Portugal, porque tem vergonha dos colegas. Já que não pode
ser doutor, vai procurar emprego lá fora, onde ninguém o conheça. Veja!? Ter
vergonha de trabalhar! No meu tempo, acabada a Primária, íamos de marmita na
mão, para as obras, e as moças p’ra costura. Agora têm vergonha! …
Separamo-nos,
com forte aperto de mão, e fiquei a pensar: têm vergonha dos colegas e
preferem emigrar…
É direito
inalienável que todos tenham as mesmas oportunidades - sempre me bati por essa
conquista, - que é cristã e é inerente à democracia, mas ao escutar esse
desabafo fiquei apreensivo.
É que sou do
tempo em que o trabalho braçal era honra, e os filhos não se envergonhavam de
coadjuvar nas tarefas paternas.
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